"Hay hombres que luchan un dia y son buenos
Hay otros que luchan um año y son mejores
Hay quienes luchan muchos años y son muy buenos
Pero hay los que luchan toda la vida
Esos son los imprescindibles"
(Bertolt Brecht)

terça-feira, 5 de janeiro de 2021

📌📜 SEMANA GAÚCHA... Contos Históricos do RS (conto VII)______CONTO FINAL______

 


No arreio do pertencimento social eles vão nos aquerenciando. Como o Tradicionalismo maneia nossas consciências. Eles não querem que você saiba!
_________ A Ideologia do Gauchismo!
A verdade histórica perde para os folcloristas. O Tradicionalismo age como cultura normatizadora, ele impoe-se e impõe seus valores de visão de mundo do latifúndio pampeano. O Tradicionalismo trabalha como indústria cultural, remodela-se junto à pos modernidade. Jovens vestindo nike e escutando músicos modernos também tem seus momentos de pilchas e de reprodução do brutal como sendo identitário. Colonos e descendentes de negros reproduzem uma cultura alheia a seus antepassados. Missas tem padres com suas "missas crioulas" e audiências do poder judiciário chegam ao ponto de serem feitas pilchadas. E o resultado é a exclusão de quem não se adequar !
Em 1954 o MTG impoe-se sobre o poder público. É criado o Instituto Gaúcho de Tradição e Folclore. Em 1966 o Hino Farroupilha (esse que cantamos hoje) é tornado o hino do estado, em plena Ditadura Militar (o MTG teve estreita relação com os golpistas de 1964). Inclusive é em 11 de setembro de 1964 (menos de 6 meses depois do Golpe) que a Semana Farroupilha é criada por lei. Essa lei é complementada em 1989 com a imposição (em seu art. 2°) de obrigatoriedade de participação de escolas estaduais, municipais e particulares nos festejos gauchescos, transformando-as em intrumentos ideológicos do latifundiários e da bagualagem normativa. Nas proximidades do dia 20 de Setembro, escolas pararam para churrasquear em nome da memória do latifúndio, ou "lives gaudérias" em Pandemia!
E não há como negar que essa ideologia do Gauchismo interere em nossa visão de nós mesmos, de nossa visão do mundo das relações sociais, da Luta de Classes. Somos adestrados, mesmo que inconscientemente, a odiar o MST, os movimentos reivindicatórios, tudo que ameaça a hegemonia dos fazendeiros se torna nosso inimigo também. O pequeno produtor renega sua própria realidade. Alguns tentam reproduzir em suas chácaras e pequenas propriedades o sistema de produção do gado e de ovinos sem conseguir subsistir. Mesmo quando aderem a produção leitera e/ou de hortifrutigranjeiros (típicos para pequenas propriedades rurais) eles se veem como grandes proprietários ao abraçar o mesmos argumentos e preconceitos dos grandes proprietários estancieiros, assumem a identidade homogeinizadora de "Ruralistas" e os mesmos costumes do tradicionalismo. Em 2018 o ex presidente Lula fazia uma caravana pelo RS e em Bagé homens pilchados à cavalo agrediram à relhaços militantes do PT. Na semana seguinte a senadora Ana Amélia Lemos/PP dizia em um evento em PortoAlegre que àqueles eram "verdadeiros gaúchos".
O Gauchismo é racista em sua essência! Além de exaltar os ditos "heróis farroupilhas", todos militares estancieiros escravistas, o Movimento Tradicionalista tenta até hoje enterrar e tergiversar o Massacre de Negros Farroupilhas em Porongos no dia 14 de novembro de 1844. Até poucas décadas os negros advindos da peonada estancieira eram impedidos de entrar nos "Bailes gaúchos" dos CTGs frequentados pelas esposas e filhas de estancieiros. Um caso um tanto curioso foi a criação do CTG Lanceiros de Canabarro em Alegrete, criado pelo racismo mas batizado com homenagem ao estancieiro farroupilha que os entregou à morte em acordo com o Império Brasileiro. Até hoje o tradicionalismo tem certa "estranhesa" às manifestações de cunho afro-descendente, principalmente os religiosos e músicais.
Mas a marca mais indelével da ideologia do Gauchismo é o MACHISMO. O MTG criou a alcunha de "prenda" às mulheres, um adereço ao gaúcho que quando não se comporta como o tradicionalismo espera é alcunhada de "china". No dia 18 de setembro de 2019 o Alegrete viu um "desfile temático" que antecede o desfile dos cavalarianos de 20 de setembro. No Desfile Temático os tradicionalistas se "preocuparam" (a seu modo!) com a "inclusão da mulher" e as representou como costureiras, bordadeiras e varredouras do "rancho". Em outro carro alegórico do desfile temático as apresentou como tosadoras de ovelhas. E deu!
O termo "china" como sinônimo de "prostituta", assim como . . . Prenda, China, Chinoca, Tiangaça, Pinguancha
Na época da ocupação e demarcação territorial, que ocorreu durante os séculos XVI até o inicio do século XIX, as mulheres que existiam naquela região, muitas das quais índias roubadas e levadas à garupa em cavalos, eram tratadas como chinas, talvez devido aos traços dos olhos assemelharem-se com as asiáticas.
Os termos chinoca, tiangaça e pinguancha, são de origem espanhola e tem o mesmo significado de china. Posteriormente o termo china tornou-se sinônimo de prostituta, pois muitas dessas mulheres eram abandonadas e acabavam sem alguém que as cuidasse.
Já a palavra prenda é muito provável que tenha sido trazido ao Rio Grande do Sul pelos colonos dos Açores, pois naquele arquipélago lusitano é tradicional uma cantiga de tirana com o seguinte regrão:
""Tirana, atira, tirana,
Vem a mim, tira-me a vida:
A prenda que eu mais amava
Já de mim foi suspendida."""
Alguns historiadores atribuem ao tradicionalismo gaúcho a criação do vocábulo prenda para designar a mulher gaúcha de bons costumes, pura, honesta, ingênua e graciosa. Quando um CTG elege suas prendas, essas devem ter, além dos atributos femininos de delicadeza, beleza e dons artísticos, uma conduta exemplar e uma participação social restrita aos eventos culturais e projetos assistenciais, para melhor cumprir seu papel social na educação e transmissão dos valores morais e cívicos da mulher gaúcha. A Família Tradicional conservadora representada, mulher como "adereço" do "Gaúcho".
Essa é a ótica de "inclusão" do Tradicionalismo. Sua visão de "inclusão" não consegue ir além de ver a mulher como mantenedora do lar ou sua emasculação laboral. Uma das músicas fandangueiras mais clássicas das rádios e bailes gaúchos, com sua letra, que é de um machismo revelador do pensar tradicionalista:
(Música do grupo Tchê Garotos)
🎶Tava cansado de me fazer de bonzinho
Te chamando de benzinho de amor e de patroa
Esta malvada me usava e me esnobava
E judiava muito da minha pessoa
Endureci resolvi bancá o machão
Ai ficou bem bom agora é do meu jeito
De hoje em diante sempre que eu te chamar
Acho bom tu ajoelhá e me tratá com respeito
Ajoelha e chora ajoelha e chora
Quanto mais eu passo laço muito mais ela me adora🎵
Mas para além de machista, o gauchismo é HOMOFÓBICO em seu âmago. Na história já alcunhava os filhos de Pelotenses que voltavam do estudos na Europa de "abichornados" por adquirirem maneirismos mais educados de falar e agir. O Tradicionalismo sempre usou da "Pedagogia da Doma" para submeter àqueles que rompiam com sua visão brutalizada de sociedade. Os diferentes são tratados como animais chucros a serem domados. A diferença é aceita a base da piada e do deboche. E tão logo os diferentes queiram assumir protagonismo e não a submissa existência subserviente eles são alvo da "doma" por parte dos tradicionalistas. Foi assim em 2002 quando o advogado José Antonio San Juan Cattaneo, mais conhecido como Capitão Gay, foi agredido durante o desfile em homenagem aos 167 anos da Revolução Farroupilha, em Porto Alegre. Após o início do desfile o então governador Olívio Dutra, devidamente pilchado (traje típico) passar em revista a tropa de mais de mil homens, surge na frente do palanque das autoridades o advogado. Em trajes típicos, o Capitão Gay, retirando o chapéu, saúda o governador e logo após retira do bolso uma bandeira do movimento gay. Logo um cavalariano se aproxima e pergunta quem ele é, dando com o relho em suas costas. Mais seis cavalarianos se aproximam e começam a agredir o advogado a relhaços de tradionalistas ensandecidos. Quase todo o estado apoiou tal ação. Em 11 de setembro de 2014 o ódio homofóbico do movimento tradicionalista se volta contra si mesmo: no início da madrugada tradicionalistas raivosos colocam fogo no CTG Sentinelas do Planalto em Santana do Livramento. Tudo porque o patrão daquele CTG iria cediar 29 casamentos em um casamento coletivo onde um dos casais era um casal homoafetivo.
É inegável que o Movimento Tradicionalista cria uma ideologia do Gauchismo que embota o tecido social com seus preconceitos imanentes e estruturas psicológicas e comportamentais impositivas. Tudo para manter-nos a cabresto na manutenção de uma sociedade favorável ao reinado de um mundo estancieiro, hoje chamado de ruralista, que, por exemplo, foi decisivo na Vitória de Jair Bolsonaro nos votos do estado.
Será que nos libertaremos destas imposições e seremos um povo realmente livre no pensar e nos costumes? Quando poderemos conviver de forma honesta com nosso passado escravista sem cantar um hino que desrespeita os negros com seu refrão "povo que não tem virtude acaba por ser escravo"?? Quando vamos conviver com as diferenças sem querer impor normativas animalescas?
Ninguém precisa ser domado!
Termino com a belíssima letra da música "Herdeiros da Pampa Pobre" de Vaine Darde, interpretada pela banda Engenheiros do Hawaii:
🎶Que pampa é essa que eu recebo agora
com a missão de cultivar raízes
se dessa pampa que me fala a história
não me deixaram nem sequer matizes?
(...)
campos desertos que não geram pão
onde a ganância anda de rédeas soltas
(...)
porque eu não quero deixar pro meu filho
a pampa pobre que herdei de meu pai
herdei um campo onde o patrão é rei
tendo poderes sobre o pão e as águas
onde esquecido vive o peão sem lei
de pés descalços cabresteando mágoas🎵
Éric Vargas
: Professor de História e Filósofo

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