"Hay hombres que luchan un dia y son buenos
Hay otros que luchan um año y son mejores
Hay quienes luchan muchos años y son muy buenos
Pero hay los que luchan toda la vida
Esos son los imprescindibles"
(Bertolt Brecht)

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Encontro da burguesia guasca


FORUM DA LIBERDADE – EDIÇÃO 2010

REABILITAÇÃO DO INDIVIDUALISMO E DA GANÂNCIA COMO VALORES MORAIS

5 MIL PARTICIPANTES, A MAIORIA COM MENOS DE 30 ANOS

Tania Jamardo Faillace[1]

O XXIII Forum da Liberdade, realizado nos dias 12 e 13 de abril, em Porto Alegre, no Centro de Convenções da PUC, trouxe algumas novidades.

Para principiar, teve como seu mote e pauta, os seis princípios político-econômicos que balizam o ideário neoliberal, conforme foi concebido pelo economista austríaco Ludwig von Mises, falecido em 1973.

Esses seis princípios focalizam alguns temas-chaves do século XX, como a oposição capitalismo-socialismo, o que é a inflação, o intervencionismo estatal, a questão da liberdade individual, etc., aos quais Von Mises dá interpretação diferente das outras escolas econômicas, como no caso da inflação, considerada uma decisão arbitrária do Governo para aumentar a oferta de moeda circulante, ao invés de uma tentativa para resolver uma crise econômico-produtiva por via monetária. Contrariamente ao rigorismo quase matemático que caracteriza normalmente a Ciência Econômica, seja qual for seu objetivo final no desenvolvimento das sociedades, o ideário de Von Mises é fundamentalmente subjetivo e psicológico, e é expresso numa linguagem coloquial, dentro da perspectiva do homem comum, a nível de suas percepções individuais imediatas, e não a nível de sua reflexão.

Não busca, pois, estabelecer as categorias econômicas ou sociais dentro de critérios históricos, sociológicos, ou científicos, recorrendo a alguma metodologia, mas se embasa nas impressões subjetivo-emocionais de um indivíduo isolado de seu contexto e de sua história.

Assim, um de seus seguidores, o jovem engenheiro Luiz Leonardo Fração, presidente do Instituto de Estudos Empresariais, define sua visão do que seria a liberdade absoluta: a propriedade absoluta do próprio corpo e a liberdade total para decidir suas ações. Instado a definir o que seria a liberdade individual absoluta dentro de uma sociedade – Fração está convicto de que cada um vive sua liberdade absoluta como melhor lhe parece, sem dever satisfações a quem quer que seja, muito menos ao Estado e aos grupos sociais. Essa liberdade absoluta coexistiria com a liberdade absoluta das outras pessoas, não sendo admitida a hipótese de que duas liberdades absolutas forçosamente se tornam relativas uma com referência à outra.

Esse ideário, que tem algumas afinidades com o anarquismo individualista do “é proibido proibir” da contracultura dos anos 70 – não implica em despreocupação com o mundo material, como era de praxe naquela época, mas, pelo contrário, assume como legítimas a luta pela riqueza e a concorrência econômica sem normas e sem fiscalização.

Conforme Eduardo Marty, argentino e fundador do Junior Achievement da Argentina, está em tempo de serem reabilitados moralmente os sentimentos de ganância e o individualismo, e aposentar de vez o altruísmo e o espírito de sacrifício que a cultura ocidental considera como valores maiores.

Esses neoliberais filosóficos pregam o egoísmo sem culpa, e rejeitam normas, regulamentos, leis, limitações. E, a nível de produção, rejeitam o planejamento econômico como regra, o controle de qualidade, a proteção dos mercados, as taxas aduaneiras, e a fiscalização das práticas comerciais hoje consideradas desleais, como o dumping e assemelhados.

Para eles, o mercado sozinho controla tudo, podendo equalizar as discrepâncias entre os concorrentes, e, inclusive, reduzir o impacto dos cartéis e dos monopólios na economia geral. Tudo isso seria espontaneamente equilibrado pelo mercado. Isto é, o consumidor escolheria livremente os melhores produtos e os mais baratos, sem necessitar de proteção ou regras do Governo.

Na linguagem dos jovens neoliberais, o Governo, qualquer governo, é uma espécie de usurpador da liberdade dos indivíduos. E qualquer ingerência sua nos negócios das pessoas é considerada como uma prepotência e ameaça de tirania.

Dentro dessa doutrina, em sua interpretação jovem (os mais velhos são menos radicais), o Governo torna-se uma Categoria ao invés de uma Função. Coisa que, certamente, há de surpreender os sociólogos em geral. Assim, o Governo é uma categoria não só diferente, como antagônica à Sociedade na qual age, e essa Sociedade não é composta por grupos de interesses conflitantes, mas por indivíduos que defendem encarniçadamente sua liberdade individual e também sua propriedade individual.

São esses jovens, portanto, avessos tanto ao Governo como à organização estatal, e também aos serviços públicos. Fração diz textualmente: “por que seremos obrigados a aceitar serviços que não queremos? escolas que não queremos, por exemplo? ainda se tolera contribuir voluntariamente com aqueles que não podem, mas que essa contribuição seja obrigatória, seja um imposto, é um ROUBO.”

Para ilustrar esse pensamento, algumas dezenas de rapazes, moças e até adultos, contratados pela Vittapromo (empresa promotora de eventos) distribuiram aos presentes folhetos contra a cobrança dos impostos no Brasil, vestindo camisetas coloridas com os nomes dos impostos e taxas cobrados pelo poder público, desde Imposto de Renda, até IPVA, IPTU, e taxas de apoio a atividades estratégicas (marinha, aeroportos, etc.)

PROGRAMAÇÃO

As atividades em si constituiram-se em palestras de abertura e painéis, absolutamente simétricos, cada um correspondendo a uma das lições de Von Mises: Capitalismo, Socialismo, Inflação, Intervencionismo, Investimento Estrangeiro, Políticas e Idéias.

Como palestrantes, pessoas de destaque empresarial e político, em sua maioria da linha liberal tradicional; outros, adeptos da versão neoliberal, e apologistas do estado mínimo; e, finalmente membros de entidades que defendem a eliminação da função estatal, substituída talvez, por uma espécie de auto-controle e auto-governo espontâneos.

A abertura do evento foi feita pelo presidente mundial da Renault-Nissan, Carlos Ghosn, um cidadão do mundo, de família líbano-brasileira, mas que fez sua vida na Europa, nos Estados Unidos, e no Japão, onde introduziu alterações profundas no sistema trabalhista e cultural daquele país, acabando – dentro da Nissan – com o emprego vitalício, e demitindo 20 mil operários de uma só vez para equilibrar as finanças da empresa. Ghosn afirmou seu gosto pelos desafios, e seu desejo de fazer fortuna pessoal como os grandes motores de sua trajetória profissional.

Os pronunciamentos mais diretos e objetivos, do ponto de vista de uma ação estratégica no macro campo econômico real, foram feitos pelos banqueiros Henrique Meirelles (Banco Central), e Pedro Moreira Salles (Itaú – private bank). O primeiro explicou a política monetária seguida pelo atual governo brasileiro e a razão de seu êxito; e Moreira Salles, também numa palestra expositiva e ilustrada, analisou a situação econômico-financeira do País, que considera muito positiva, e seus acertos, que impediram que o Brasil fosse contaminado pela crise, e hoje se tornasse referência de crescimento econômico no mundo.

Também falaram Armínio Fraga, sobre sua experiência no governo anterior; e alguns teóricos do “anarco-capitalismo”, como David Friedman (norteamericano), e Eduardo Marty (argentino), mencionado antes, além de Hélio Beltrão, Fundador do Instituto Mises Brasil, fundador do Conselho de Governança do Instituto Millenium, conselheiro do Grupo Ultra, e detentor de outros títulos e cargos.

Junto com o venezuelano Marcel Granier, Beltrão recebeu um prêmio destaque do IEE – Prêmio Libertas 2010. Dono de um discurso muito inflamado, mas sem fazer proposições concretas quanto às estratégias recomendadas contra o Governo, Beltrão parece considerar que todo o problema do mundo atual consiste em haver Governo e Estado. Não explicou, porém, o que propõe em troca. Já Granier, presidente da RCTV, que não teve renovado seu contrato de concessão pelo governo venezuelano, foi agraciado pelo Prêmio Liberdade de Imprensa 2010. Seu discurso foi um discurso moderado.

GEOECONOMIA

Em relação à política mundial, as maiores e mais inflamadas críticas se dirigiram aos governos “populistas” da América Latina, com muitas acusações contra Chávez, chamado de tirano e ditador e outros adjetivos assemelhados, e um pouco menos a Evo Morales.

Assim, os anos Pinochet no Chile foram criticados por seus desmandos no campo dos direitos humanos, mas foram elogiados pela abertura total de sua economia ao capital estrangeiro. Essa análise da economia chilena desde os anos Pinochet até hoje, foi abordada em linhas gerais por Eliodoro Matte Larrain, presidente das Empresas CMPC (produtora de celulose), diretor do Banco Bice e do Bice Corp e da Mineradora Valparaíso. A CMPC, para quem ainda não sabe, possui, 2,2 milhões de ha em pinheiros e eucaliptos no Chile e comprou recentemente a Unidade Guaíba da Aracruz/Fibria, no RS, município de Guaíba.

Na área acadêmica, destacou-se no evento, o professor espanhol Fernando Navarrete, que é também economista do Banco de Espanha. Navarrete discorreu sobre os anos de estagnação da Espanha franquista, e os erros cometidos pelo governo socialista que se seguiu, até que, nos últimos anos, fosse assumido o modelo neoliberal em sua plenitude, com privatizações generalizadas e abertura total do mercado, o que foi facilitado pela União Européia. Hoje, aplaude ele, a Espanha conquista espaços internacionais e investe em países estrangeiros, como é o caso do Brasil (Telefonica, banco Santander e outros empreendimentos).

No quarto painel, surpreendeu a jornalista a declaração de Arthur Badin (CADE) de que o petróleo brasileiro seria monopólio estatal, quando, – a partir do governo FHC, e os primeiros dos leilões da Petrobrás, – quase 60% de suas ações foram parar em mãos de petrolíferas estrangeiras, sendo que sua política econômica e de preços é determinada lá fora. Questionado posteriormente a esse respeito, Badin não contra-argumentou – parecia não se lembrar dos “contratos de risco” votados ao tempo de Ernesto Geisel, em 1974, mas só postos em prática do governo FHC em diante.

Do último painel, participaram o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, Jorge Gerdau Johannpeter, e o ex-presidente venezuelano, Jorge Quiroga. Fernando Henrique fez um pronunciamento de linha histórico-sociológica, enfatizando a questão das liberdades democráticas, não apenas a liberdade individual, mas comentando que os maiores tiranos são os egressos das classes populares. Johannpeter também enfatizou a liberdade (mote título do Forum) e os 23 anos de existência do mesmo, tendo participado dele outras vezes, enquanto Quiroga fez um discurso muito empolgado, de linguagem direta a favor também do neoliberalismo e das liberdades individuais, e acusando com muita veemência os “governos populistas” da América Latina e sua política de estatizações.

Curiosamente, nada foi comentado sobre os governos neoliberais que atentam contra as liberdades democráticas, como a Colômbia, o Peru e o Chile, com suas práticas anti-indigenistas.

Também a questão ambiental não foi tocada durante o evento, uma vez que todos advogaram o crescimento econômico ilimitado.

AEROPORTOS PÚBLICOS

Numa linha um tanto diferenciada, falou o empresário brasileiro-norteamericano David Neeleman, proprietário de quatro empresas de aviação, Jet Blue Airways e Morris Air (norteamericanas), e Westjet (canadense). Agora ele investe no Brasil com a empresa Tudo Azul, que pretende inovar em matéria de qualidade de aviões e serviços. Neeleman mostrou posicionamentos diferenciados quanto a dois assuntos: sua surpresa ao saber que as empresas de aviação brasileiras compram aviões lá fora, quando “os aviões da Embraer, afirmou ele, são os melhores do mundo em matéria de segurança, conforto e operação. Comprei 15 e pretendo ir até a 90 aeronaves, se tiver condições de alargar o mercado”.

Outro tema que o distinguiu dos demais, foi sua afirmação de que os aeroportos comerciais devem ser sempre públicos. “Aeroportos não devem ter lucros, mas servirem às necessidades de transporte das pessoas. Aeroportos privados tendem a encarecer todos os serviços, os custeios das empresas e os preços das passagens. Há mais segurança para todos, empresas e passageiros, se o aeroporto for público”. Informou também que, nos Estados Unidos, a generalidade dos aeroportos é público, seja a nível federal, estadual ou municipal.

Neeleman ainda não teve, certamente, a oportunidade de ser informado a respeito de alguns objetivos do ministro da Defesa, Nelson Jobim, com relação ao assunto. Nem com respeito às pressões de algumas empreiteiras em ação em Porto Alegre[2], para semear espigões na zona Norte, interferindo com a segurança de vôo.

A opinião desse empresário, de tipo bastante jovial, é de que os aeroportos precisam ter grandes áreas de reserva para expansões futuras. Cercar fisicamente um aeroporto, diz ele, compromete o desenvolvimento econômico da região.

Palestrantes

Palestra inicial – Carlos Ghosn, presidente da Renault-Nissan

primeiro painel – capitalismo

Armínio Fraga – Conselho do Bovespa

Eliodoro Matte – presidente da CMPC chilena

Pedro Moreira Salles – presidente do Banco Itaú- private bank

segundo painel – socialismo

João Quartim de Moraes –fundador da VPR, fundador da revista Debate

Juan Fernando Carpio – diretor do Instituto para a Liberdade, em Quito

Rodrigo Constantino – colunista de O Globo, diretor do Instituto Liberal

terceiro painel – inflação

Ricardo Murphy – ministro de Defesa e Economia no governo argentino de LaRua

Stephen Kanitz - mestre de administração de empresas pela Harvard Univesity, Bovespa

Tom Woods – historiador, autor do best seller New York Times

segunda palestra especial – Henrique Meirelles

quarto painel – intervencionismo

Arhur Badin – CADE – presidente do conselho administrativo de Defesa Econômica

David Friedman – PhD em Física pela Univ. de Chicago. filho de Milton Friedman.

Eduardo Marty – fundador da Junior Achievement da Argentina

quinto painel

David Neeleman – empresário da aeronáutica

Fernando Navarrete – espanhol, economista do Banco de Espanha

Xingyan Feng – acadêmico chines; não conseguiu visto para viajar e foi substituído por Tom Palmer, que discorreu sobre a China hoje we seu caminho misto, capitalista e liberal com controle estatal.

sexto painel

Jorge Quiroga

Jorge Gerdau Johannpeter

Fernando Henrique Cardoso

Lançamentos de Índices durante o FL

Índice de Liberdade Econômica - versão em português. Parceria IEE/Instituto de Liberdade do Rio Grande do Sul/The Heritage Foundation/Wall Street Journal

Índice Internacional de Direitos da Propriedade (inter-relação do papel dos direitos de propriedade material e intelectual na comunidade global) – parceria Instituto Liberdade/IEE – projeto do Programa de Bolsas de Estudo Hermano de Soto, da Aliança de Direitos de Propriedade (ADP) – 115 países participam desse índice, somando 96% do PIB mundial.

Esse índice avalia três áreas: Ambiente Legal e Político, Direitos de Propriedade Físicos e Direitos de Propriedade Intelectual, e tem por objetivo desenvolver um indicador classificatório de países quanto a esse aspecto.

[1] escritora e jornalista de Porto Alegre, RS

[2] Arena do Grêmio no bairro Humaitá prevê prédios de 60m de altura onde só são permitidos 12m,a fim de preservar a segurança de vôo.